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Sabina Spielrein, a pulsão de morte e a psicanálise na Rússia

Fonte: Mulheres Psicanalistas 

Sabina Spielrein foi a segunda mulher aceita na Sociedade Psicanalítica de Viena. Curiosamente, ela foi aprovada como membro na mesma noite que Hilferding se desligou, em 11 de outubro de 1911. Não houve qualquer polêmica ou controvérsia em sua entrada, e ela participou das reuniões somente até março do ano seguinte (apesar de ainda constar como membro da Sociedade até 1914). 
Dentre as primeiras psicanalistas, ela talvez seja a mais conhecida nos dias atuais, o que não significa que sua obra seja devidamente apreciada. O interesse dedicado a ela passa muitas vezes por seu envolvimento com Jung e os conflitos que se desenvolveram a partir disso. Focando nesse aspecto escandaloso de sua vida, foi lançado em 2011 um filme, “Um Método Perigoso”, que contribuiu para atrair atenção para a vida de Spielrein. 
Há uma extensa bibliografia sobre Sabina, e acompanhar detalhadamente sua vida exigira mais espaço do que é possível no presente artigo. Remetemos os leitores a alguns dos principais estudos de sua vida e obra. Tentaremos manter o foco em sua participação na Sociedade Psicanalítica de Viena e na sua principal contribuição teórica, o artigo “A Destruição como Origem do Devir”. 
Sabina Nikolaievna Spielrein nasceu em 25 de outubro de 1885 em Rostov, Rússia. No ano de 1904 é internada no hospital psiquiátrico Burghölzli, em Zurique, onde recebeu tratamento até junho de 1905. Quem a tratou, fazendo uso da psicanálise, foi Jung, que nos anos seguintes se tornaria o favorito de Freud. 
Assim que recebeu alta, iniciou os estudos de Medicina na Universidade de Zurique, que concluiu em 1911 com uma tese sobre o tratamento psicanalítico de uma paciente esquizofrênica. Nesse mesmo ano, se muda para Viena e passa a fazer parte da Sociedade Psicanalítica de Viena, como já havíamos indicado. Seu trabalho mais conhecido, “A Destruição como Origem do Devir”, já estava sendo escrito quando morava na Suíça (Jung a estava ajudando na redação do artigo) e quando chega na capital austríaca apresenta uma versão resumida do trabalho para os colegas vienenses. 
O texto apresentado, intitulado “On Tranformation”, expunha a hipótese de um componente destrutivo da pulsão sexual. Spielrein utiliza como suporte a suas ideias elementos da mitologia e literatura, o que rendeu algumas críticas de Freud (bem como de outros presentes), embora tais críticas pareçam, na realidade, dirigidas a Jung. Ela declara, ao final do debate, que falhou na tentativa de demonstrar os pontos principais de sua teoria, e esclarece algumas ideias, sem muitos detalhes. 
No ano seguinte, o tema da apresentação aparece finalmente publicado em sua obra “A Destruição como Origem do Devir”. Nesse texto, Spielrein expõe toda uma série de hipóteses originais, principalmente a noção de um masoquismo primário e a existência de um componente destrutivo da pulsão sexual (comumente visto como o precursor do conceito de pulsão de morte). 
Em 1912, Spielrein deixa Viena e, embora existam indícios de que planejou retornar, isso nunca ocorreu. Ela se casou com Pavel Scheftel em Rostov e no intervalo de uma década passa por várias cidades. Mora por dois anos em Berlim, onde nasce sua primeira filha. Passa um breve período em Zurique, em que o marido a abandona e retorna para a Rússia, e em 1915 se muda para Lausanne, onde fica até 1920. Os três anos seguintes são passados em Genebra, onde trabalha no Instituto Jean-Jacques Rosseau e conhece Claparède e Piaget (que é analisado por ela). Spielrein dá aulas no Instituto sobre psicanálise educativa, e diversas conferências para leigos. Em 1922, tanto ela quanto Piaget participam do VII Congresso Internacional de Psicanálise em Berlim, e a influência de um sobre o outro é visível, já que citam-se mutuamente em suas palestras. 
Em 1923 decide retornar à Rússia, primeiro a Moscou, onde é a psicanalista com melhor formação. Faz parte da presidência da Associação Psicanalítica Russa e é uma das responsáveis pelos cursos científicos do Instituto Psicanalítico Estatal. Parte finalmente para Rostov em 1924 e retoma o casamento com Pavel Scheftel, a que se segue, em 1926, o nascimento de sua segunda filha. A situação política da Rússia se torna mais instável: em 1930 a Sociedade Psicanalítica Russa é dissolvida e em 1933 a prática da psicanálise é proibida. 
Spielrein sobrevive trabalhando como médica. Boa parte de sua família é fuzilada na década de 1930 por acusações de participação em organizações contra-revolucionárias. No início da década de 1940, o exército alemão invade Rostov e Sabina Spielrein, suas duas filhas e milhares de judeus são assassinados. 
Ao longo de sua carreira como psicanalista, publica uma grande variedade de trabalhos. Seus mais de 30 artigos tratam de temas que vão desde psicoses à psicanálise de crianças. Mesmo com uma produção tão extensa, permaneceu largamente desconhecida até a década de 1970, quando foram descobertos documentos e cartas deixadas por ela sob os cuidados de Claparède. 
Em fevereiro de 1912 uma outra mulher se junta à Sociedade Psicanalítica de Viena. Trata-se da também russa Tatjana Rosenthal, que, assim como Spielrein, estudou Medicina em Zurique. Ela aparece listada como membro da Sociedade entre 1912 e 1914. 
Ela nasceu em São Petersburgo em 1884, de família judia. Desde muito cedo já tinha envolvimento com causas políticas, o que fica evidente em seu engajamento com o movimento operário, como presidente da Associação de Estudantes de Moscou. Em 1906 foi a Zurique, onde escolheu estudar Medicina e se especializou em psiquiatria. Em 1911 conclui os estudos e retorna à Rússia para divulgar as ideias freudianas. Em 1919 recebe o cargo de diretora da Clínica de Tratamento de Psiconeuroses, no Instituto de Pesquisas sobre Patologia Cerebral, dirigido por Vladimir Bekterev. Nessa instituição, ainda em 1919, profere uma série de conferências sobre psicanálise. Ela participa ativamente da implantação da psicanálise no país, e teve particular influência no campo de tratamento de crianças. Foi uma das idealizadoras, junto com Vera Schmidt, do Lar Experimental para Crianças, onde as crianças eram educadas seguindo princípios da psicanálise e também do marxismo. Suicidou-se em 1921, em circunstâncias não muito claras. Seus textos são pouco conhecidos, e o mais famoso trata de Dostoiévski.” 
Fonte: Marcus Vinicius Neto Silva, Érica Silva Espírito Santo. A história das primeiras mulheres psicanalistas do início do século XX. Revista história, histórias. Brasília, vol. 3, n. 6, 2015. ISSN 2318-1729
Extraído da página: https://www.facebook.com/mulherespsicanalistas/?fref=ts

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